sábado, 11 de julho de 2009

Sobre o Uso da Força: 4ª Parte







MODELOS, METODOLOGIAS E PADRÕES MÍNIMOS DO USO DA FORÇA.
Os modelos, as metodologias / processos, as normas legais de procedimento e as regras de engajamento constituem tão somente, parâmetros ou padrões mínimos que norteiam a ação policial e que podem ser aplicados no nível gerencial, tático ou operacional, como medida de planejamento, análise reflexiva e controle num contexto circunstancial, mediato ou imediato, de aplicação do uso comedido da força legal.

Destarte, é importante destacar que, no âmbito da particular dinâmica do emprego do uso comedido da força legal, não há receita nem tampouco fórmula exata pré-estabelecida.

Cada situação de interação crítica decorrente da ação de polícia, a partir da relação estabelecida entre a autoridade policial e o indivíduo social reserva um conjunto de características singulares, cujas percepções, ações e reações não podem ser mensuradas, organizadas e sistematizadas num único procedimento, como se fosse possível adotar um padrão universal.

Cada caso é um caso, único e exclusivo, e exige da autoridade policial a compreensão dos distintos aspectos e fatores de natureza ambiental e comportamental que incidirão no processo particularizado de tomada de decisão com vistas à mediação e solução pacífica dos conflitos.

Nesse sentido, à guisa de fornecer subsídios para pensar modelos, metodologias / processos, regras de engajamento e normas de procedimentos aplicados à realidade brasileira, a literatura policial internacional nos oferece inúmeros exemplos bastante interessantes, dentre os quais destacamos: a) o modelo FLECT do uso comedido da força legal ; b) a doutrina de gerenciamento de crises ; e, c) o modelo ICS (Incident Command System ).


CONCLUSÃO


Dentre os inúmeros fatores concorrentes para a conformação do modelo brasileiro em face do exercício do poder administrativo instrumental coercitivo, consubstanciado no conceito de poder de polícia, verifica-se em tese que a principal razão condicionante para a aplicação do uso “legítimo” da força “legal” policial por parte das autoridades policiais encarregadas de fazer cumprir a lei, encontra-se engendrada na própria cultura política, jurídica e social da nação.

Tal hipótese está alicerçada na dicotomia existente entre a concepção de serviço público e o exercício de poder de polícia administrativo. Em outras palavras, o exercício do poder de polícia administrativo, mediante o emprego legítimo da força legal é compreendido pela sociedade como uma espécie de prestação negativa, que impõe limites à ação individual motivada por interesses particulares enquanto que o serviço público se destaca como prestação positiva do estado.

É nessa contradição axiológica, conformada no âmbito de um modelo de sociedade hierárquica alicerçada desigualmente em bases relacionais, com baixíssimo nível de civilidade e de consciência cidadã, que reside no âmago do imaginário coletivo social, a falsa crendice de que o uso legítimo da força constitui um ato coercitivo negativo. O verdadeiro ato coercitivo negativo, espécie de prestação negativa do estado, é aquele que decorre do desvio de poder, mormente caracterizado como abuso de autoridade, violência arbitrária ou qualquer outro tipo penal que venha configurar o estado de ilicitude.

Esse pensamento, de um lado, negligencia as conquistas democráticas da civilização, a própria idéia de estado democrático social de direito, enfim os fundamentos da legitimidade e do consentimento social pactuado na forma de contrato, e do outro lado da mesma moeda subverte a noção de interesse público enquanto prestação positiva do estado que incide sobre a qualidade de vida e o bem estar social da coletividade.

A superação do atual paradigma, independentemente das eventuais idiossincrasias, somente será possível através da redução do déficit de consciência cidadã, individual e coletiva, que tanto caracteriza a sociedade brasileira.

Não obstante, também não se pode deixar de reconhecer a existência de outros fatores correlatos ao modelo de organização e funcionamento das instituições policiais encarregadas de fazer cumprir a lei. Nesse sentido, urge de forma imperiosa, a premente necessidade em se estabelecer no âmbito nacional um marco legal específico de regulação, devidamente ajustado aos diplomas internacionalmente reconhecidos, com vistas à aplicação do uso comedido da força legal.

Outro aspecto relevante que deve nortear a formulação de políticas de segurança pública, objetivas e consistentes, sem desmerecer outras iniciativas nas áreas de gestão, modernização e moralização das instituições policiais, é a valorização do profissional encarregado de fazer cumprir a lei. Parafraseando o saudoso Coronel Carlos Magno Nazareth Cerqueira, o exercício legal e tecnicamente responsável na aplicação comedida do uso legítimo da força legal somente será alcançado quando as autoridades policiais forem efetivamente bem capacitadas, bem equipadas, remuneradas dignamente e motivadas para o exercício de sua função. A capacitação, a logística, a remuneração e a motivação são condicionantes interdependentes que atuam diretamente na ação policial influenciando os resultados.

Enquanto essa tríade de esforços (transformação cultural, gestão institucional e investimento no capital humano) não for devidamente equacionada, continuaremos sucumbindo diante das tragédias que nos assolam diariamente. Continuaremos vivendo numa sociedade na qual a autoridade policial é constantemente questionada (Você sabe com quem está falando?) e onde as mães (inclusive a mãe gentil Brasil) exercem o poder coercitivo sobre os seus filhos chamando a polícia. Ou será que ninguém nunca ouviu uma mãe dizer para o filho: Menino (a), se você não se comportar, vou chamar a polícia!


Principais Referências Bibliográficas:

“Código de Conduta para os Funcionários Encarregados de Fazer Cumprir a Lei” (ONU – Resolução nº 34 / 169 de 1979)

Constituição da República Federativa do Brasil. 27º edição (atualizada e ampliada). Editora Saraiva, São Paulo: 2001.

Giddens, Anthony. Sociology. Polity Press, Cambridge, Inglaterra. Edição em castelhano: 2ª edição (ampliada e revisada), Alianza Editorial, S.A. Madrid: 1994.

Lazzarini, Álvaro... ‘et. al.’Direito Administrativo da Ordem Pública. 2ª edição, Forense, Rio de Janeiro: 1987.

“Princípios Básicos sobre o Emprego da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários Encarregados de Fazer Cumprir a Lei” (8º Congresso da ONU sobre Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente, Havana, 1990).

2 comentários:

Miguel disse...

Apelo ao Voto em Branco...

Para acabar com as politiquices...

http://www.petiweb.org/

Anônimo disse...

Olá! Repasso uma reportagem sobre o oxi, se tiver como divulgar no seu blog, agradeço imensamente. Obrigada! http://www.infosurhoy.com/cocoon/saii/xhtml/pt/features/saii/features/main/2011/09/15/feature-02

Cristine Pires
Jornalista - MTB 7847
crispires@terra.com.br